Melhorar a vida: um grande desafio
Por: Jerônimo de Almeida Neto*
O desafio de melhorar a vida começa com uma grande dificuldade que é conceituar melhoria. Quando alguém vive em um barraco, integrado a um núcleo de favela, melhorar a vida significa construir uma casa de alvenaria. Quando a casa já existe, mas a rua não tem asfalto, melhorar a vida pode ser providenciar o calçamento daquela rua, quando não temos saneamento, implantar a rede de esgoto e disponibilizar água tratada e encanada, pode fazer a vida de muitas pessoas infinitamente melhor.
Para as pessoas que já têm casas, em bairros bem estruturados, melhorar a vida pode ser disponibilizar-lhes rondas policiais pelas ruas do bairro e aumentar-lhes a sensação de segurança. Para quem tem um enfermo na família, em muito melhora a vida quando é atendido em um hospital bem aparelhado e, preferencialmente, sem custos. Para quem está triste, pode melhorar a vida receber um sorriso, um abraço amigo ou qualquer outra manifestação de carinho. Enfim, melhorar a vida pode ter muitos significados, a depender das condições em que nos encontremos em dado momento. Qual o problema, então? – O problema é: como promover a melhoria.
Na vida privada, cada um é responsável por aquilo que deseja ver melhor. Na vida pública transferimos esta responsabilidade para o Estado. É ele o responsável por melhorar nossas vidas, é dele que cobramos que casas sejam construídas, que ruas sejam calçadas, que a água e o esgoto sejam tratados, cobramos hospitais equipados e gratuitos, cobramos escolas para nossos filhos, cobramos segurança, iluminação nas vias públicas, cobramos semáforo na esquina, afinal, atravessar a rua quando os veículos param é mais confortável e seguro.
Ao observarmos o que acontecia na antiguidade, notamos que o Estado Romano, por exemplo, não tinha estas responsabilidades todas. É certo que naquela época nem havia tanto desenvolvimento assim. Nos importa aqui observar que a função do Estado naquela época se limitava a recolher impostos para manutenção dos exércitos para a defesa do território. Certamente Nero não implantou nenhum programa de construção de casas populares, nem tinha isto como preocupação. O povo ainda não tinha a consciência de que o Estado deveria trabalhar para melhorar sua vida.
Com o passar dos anos, diante das reivindicações populares, o Estado teve que ampliar seu campo de atuação e assumir novas funções. Hoje, precisa prover Educação, Saúde, Habitação e Segurança Pública.Tem ainda que cuidar da defesa do território, da Cultura, da promoção humana, do enfrentamento às desigualdades sociais, tem que responder pela Economia pelas relações com outros povos, pela preservação do meio ambiente enfim, por uma série de coisas impensáveis décadas atrás.
Ocorre que nós, humanidade, temos dificuldades com o trato coletivo de todas estas questões. A melhoria é sempre pensada individualmente. Todos queremos melhorar, mas geralmente nos importa mais melhorar nossas vidas e não a vida da coletividade. Com um agravante que é o alto custo que cada melhoria impõe a este ser chamado Estado, cuja única fonte de arrecadação, pois não se pode pensar em renda quando falamos nele, é a contribuição de cada cidadão ou cidadã. Em síntese: a melhoria de nossas vidas depende de todos nós.
Se não existe almoço de graça, como costumamos ouvir no senso comum, também não existe melhoria sem custo, assim, alguém, sempre tem que pagar a conta. Neste caso, toda a coletividade. Mas nem sempre estamos dispostos a dar nossa contribuição para o pagamento da conta, principalmente quando não somos diretamente beneficiados pelas melhorias. Nosso egoísmo, muitas vezes, nos impede de aceitarmos a divisão justa. Sim, justa, não igualitária, porque nem sempre a igualdade é o critério mais justo.
As pessoas que possuem as melhores condições de vida, nem sempre consideram como sua a responsabilidade pela melhoria da vida de todos. Quando têm necessidade, pagam por serviços e produtos que deveriam dividir com a sociedade. Paga-se pela escola dos filhos, mas exige-se a devolução, ao menos de parte desse valor, na forma de restituição do imposto de renda. Paga-se por atendimento médico, por opção, mas igualmente cobra-se a devolução do Estado, nas mesmas condições. Sem contar que muitos compram comprovantes para diminuir sua parcela de contribuição na declaração de rendimentos.
Hoje, enquanto parte da população luta para ter atendidas suas necessidades, outra parte isola-se dos grandes problemas sociais, adotando soluções individuais, na esfera privada, em detrimento do bem da coletividade. Neste sentido, melhorar a vida passa a ser um objetivo meu e não nosso. Quanto ao Estado, quero apenas que me dê condições de conseguir o que eu preciso para viver sempre bem, melhorando sempre e, se puder não contribuir para o cuidado de todos, melhor.
Finalmente, considero impossível pensar em melhorar a vida, sem pensar coletivamente. Melhorar a vida, portanto, implica em abrir mão do egoísmo, do individualismo e da ganância, assumindo como nossa e não minha, a responsabilidade pelo bem comum.
Jerônimo de Almeida Neto
é sociólogo, pedagogo e presidente da ACESSO*